O Brasil nunca teve tantos agrotóxicos liberados: nos últimos quatro anos, foram mais de 2.182 novos registros, segundo a Coordenação-Geral de Agrotóxicos e Afins (CGAA). No mesmo período, ao menos 14 mil pessoas recorreram aos sistemas de saúde devido à contaminação por esses agentes químicos, registrou o Ministério da Saúde.
Nesse cenĂĄrio, saber o que estĂĄ sendo colocado à mesa nunca foi tão importante. Uma equipe da Universidade de São Paulo (USP) desenvolve um dispositivo que poderĂĄ ajudar nesse processo. Na etapa atual do projeto, o sensor de papel mensura, em tempo real, a presença do fungicida carbendazim e informa, pelo telefone celular, a quantidade do químico.
Para criar a solução tecnológica, que funciona a partir de uma reação eletroquímica, os cientistas brasileiros depositaram uma tinta de carbono condutora de eletricidade sobre uma tira de papel kraft. A técnica de impressão utilizada é similar a de estamparia de roupas e tecidos. "O papel foi escolhido porque é um material barato, disponível e fĂĄcil de trabalhar, além de ser ambientalmente amigĂĄvel", afirma Osvaldo Novais de Oliveira Junior, professor do Instituto de Física de São Carlos (IFSC-USP).
O também coautor do estudo explica que, quando o pesticida estĂĄ presente na amostra, ele interage com os eletrodos de carbono, alterando a corrente elétrica que flui por ele. "Essa alteração é medida e pode ser usada para quantificar a concentração do pesticida carbendazim na amostra", detalha. Devido à porosidade do papel, foi possível depositar mais tinta de carbono, o que aumentou a sensibilidade do sensor às amostras.
Nos experimentos, em um primeiro momento, a equipe usou alimentos adquiridos em mercados locais, mas eles não estavam contaminados — o uso do carbendazim estĂĄ sob processo de extinção no Brasil. Depois, o sensor foi testado em amostras de maçã e repolho previamente contaminadas pelos pesquisadores. Dessa vez, o dispositivo teve o resultado esperado. "Usamos amostras de carbendazim com concentrações conhecidas para testar a sensibilidade e especificidade do sensor", relata Oliveira Júnior. "Queremos dizer que o sensor só dĂĄ resultado positivo se houver carbendazim nas amostras, não sofrendo interferĂȘncia de outras substâncias que possam estar na superfície das frutas e verduras."
Na avaliação, a nova tecnologia foi comparada com o método de cromatografia líquida, convencionalmente utilizado para detectar resíduos de agrotóxicos em alimentos. Ronaldo Ferreira do Nascimento, professor no Departamento de Química Analítica e Físico-Química da Universidade Federal do CearĂĄ (UFC), explica que, na abordagem tradicional, as substâncias são separadas de acordo com as propriedades físico-químicas. "Elas, então, são direcionadas para um detector que registra a presença dos agrotóxicos na forma de um grĂĄfico denominado cromatograma", afirma. Cada pico no cromatograma é proporcional à concentração do agrotóxico.
Fonte: A Voz da Região / Correio Braziliense