O poder da Barbie: entenda por que tudo ficou rosa de repente

Com estreia do filme, tendência Barbiecore invadiu vitrines, redes sociais e restaurantes. Saiba como a boneca mais famosa do mundo movimenta tanta gente

Por Thais Borges em 22/07/2023 às 10:42:12

Olhe em volta: a pizza é rosa, o drink é rosa e tem glitter, as vitrines viraram monocromáticas. Toda confeitaria que se preze tem ao menos uma sobremesa rosa – algumas têm um menu inteiro. Provavelmente, havia mais pessoas vestidas de rosa nas ruas nesta última semana do que em qualquer outro período recente. Tem limusine rosa gigante no meio de shopping e caixas de boneca em tamanho de gente real pelos corredores. Tem até o famigerado – e controverso – acarajé rosa.

De repente, o mundo foi colorido por uma única cor. Poderia ser a Barbieland – a terra da Barbie –, mas é Salvador. Na verdade, até mesmo as páginas das prefeituras de cidades como a capital e Feira de Santana, além do governo da Bahia, tiveram seu percentual de imagens pink aumentado nos últimos dias, com postagens com alusões ou trocadilhos com o longa Barbie, que já é a segunda melhor estreia da história nos cinemas brasileiros. Em cartaz desde quinta-feira (20), o filme dirigido por Greta Gerwig (Adoráveis Mulheres) e estrelado por Margot Robbie (Aves de Rapina) e Ryan Gosling (La La Land) parece personificar a mais curiosa metalinguagem.

Assim como a Barbie personagem vai parar no mundo real na produção, a Barbie marca parece ter feito o mesmo. A Barbiecore, tendência de moda que veio forte nas passarelas em 2021, deixou de ser apenas um estilo que prioriza o rosa-choque para se tornar tendência de vida e consumo.

Mas o que está por trás de tanta força? Há praticamente consenso entre especialistas que, apesar de a Barbie ser veterana nos filmes, com mais de 40 animações lançadas, não há nada como agora. Ao mesmo tempo, também não há precedentes recentes quanto ao próprio engajamento em torno da película e de sua bilheteria. Segundo o Ingresso.com, o filme teve a maior pré-venda do ano, com expectativas sendo superadas em 166%.

Margot Robbie e Ryan Gosling interpretam Barbie e Ken
Margot Robbie e Ryan Gosling interpretam Barbie e Ken. Crédito: Divulgação

"A questão do filme é muito importante para a fabricante, porque faz com que a Barbie fique em órbita. Ela precisa sempre se renovar para não ser esquecida. Os filmes fazem parte dessa proposta: a partir dele, você vende brinquedos, produtos", diz a pesquisadora Fernanda Roveri, professora da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e autora do livro Barbie na Educação de Meninas: do Rosa ao Choque.

Para a professora Kênia Mendonça Diniz, doutora em Educação e docente da Universidade Estadual de Minas Gerais (Uemg), todo esse poder vem do fato de que a Barbie hoje alcança diferentes públicos. "Toda essa memória afetiva vai sendo passada de geração em geração. Quando a gente observa a Barbie num corpo humano, você tira dela a concepção de boneca. Tem a identificação: hoje ela tem um corpo, é humana como eu", reflete.

Ícone

A Barbie foi lançada oficialmente em 1959, apesar de só ter chegado ao Brasil na década de 1980. Ela foi criada por Ruth Handler, uma das fundadoras da Mattel ao lado do marido Elliot. Na década de 1950, não havia bonecas com corpo de adulto para meninas. Elas só brincavam com bonecas que imitavam bebês.

Mas Ruth viu que existia um nicho de mercado quando percebeu que sua filha, Barbara - que viria a dar nome à Barbie - gostava de brincar com bonecas de papel e vê-las interpretando funções de adulto. Numa viagem para a Alemanha, Ruth conheceu a boneca Bild Lili, inicialmente concebida para adultos por ser uma figura mais sensual, mas que caiu no gosto das crianças alemãs. Lili serviu de inspiração para aquela que viria a ser a primeira Barbie.

De lá para cá, a Barbie ganhou profissões, família, casa, escritório, animais de estimação e uma infinidade de produtos associados, incluindo linhas para casa, escola e roupas. Além de linhas exclusivas para colecionadores e até edições especiais como a Role Models, que criou uma Barbie inspirada na cientista baiana Jaqueline Goes, que ficou conhecida após sequenciar o genoma do coronavírus no Brasil.

Isso só foi possível porque, ao longo dos anos, a Barbie deixou de ser apenas um brinquedo, como explica a professora Fernanda Roveri, para se tornar um ícone. Houve um esforço da fabricante para criar um brinquedo com personalidade feminina, afirmar que ela era humana embora não fosse, tivesse um padrão de sensibilidade, dialogasse com padrões sociais e projetasse uma imagem idealizada. Tudo ao mesmo tempo.

"A Barbie é um produto cultural que diz muito sobre a nossa sociedade, sobre os valores, sobre o que a gente espera de uma mulher, dos meninos, dos homens. É um elemento da nossa cultura que vai dialogando com o que a sociedade espera e produz", analisa.

Uma limusine rosa foi estacionada no meio do shopping da Bahia para os clientes
Limusine rosa foi estacionada no meio do Shopping da Bahia para clientes tirarem fotos. Crédito: Divulgação
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Fernanda Roveri, professora da Unicamp e autora de Barbie na Educação de Meninas: do Rosa ao Choque

"A Barbie é um produto cultural que diz muito sobre a nossa sociedade, sobre os valores, sobre o que a gente espera de uma mulher, dos meninos, dos homens. É um elemento da nossa cultura que vai dialogando com o que a sociedade espera e produz"

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No mestrado, a professora Kênia Mendonça Diniz pesquisou a Barbie e os filmes da boneca produzidos até 2012. Até então, todos eram computadorizados. Em geral, havia uma mensagem - em geral, por meio de música. Na maioria deles, a Barbie é bem-sucedida. Se por acaso for pobre, é porque provavelmente ainda vai ter sucesso e vai encontrar um Ken.

É uma mulher que é engraçada, divertida e, ao mesmo tempo, cuida da casa e trabalha. Para a professora, é a construção de um ideário a ser alcançado, no imaginário infantil. Mas isso está longe de ser só para as meninas. Ken, o boneco que foi inspirado no outro filho de Ruth Handler, é praticamente um príncipe. Além de ser educado e delicado, apoia os sonhos da Barbie e é tão bem-sucedido financeiramente quanto ela.

"O lado masculino também está sendo trabalhado. Você diz: "olha, homem, para ter uma parceira como a Barbie, você tem que agir dessa forma", explica Kênia.

Mesmo com todas as versões que vieram ao longo das décadas, a principal característica da Barbie são os cabelos longos, loiros e os olhos claros. "Será que se a Barbie fosse uma mulher negra, mesmo com essas características da Barbie, ela teria se perpetuado ou viria se perpetuando como a versão da Barbie que conhecemos hoje? A gente pode, sim, admirar essa mulher com essas características, mas não introjetar como a única ideal e correta".

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Kênia Diniz, professora da UEMGr

"Será que se a Barbie fosse uma mulher negra, mesmo com essas características da Barbie, ela teria se perpetuado ou viria se perpetuando como a versão da Barbie que conhecemos hoje? A gente pode, sim, admirar essa mulher com essas características, mas não introjetar como a única ideal e correta"

Fonte: Correio

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