Um idoso de 80 anos foi readmitido no trabalho quase seis décadas após ser preso pela ditadura militar. Osmar Ferreira trabalhava no Banco do Estado da Bahia (Baneb), em Feira de Santana, e ficou 12 dias sob torturas dos militares. Ele se apresentou ao banco para readmissão nesta quarta-feira (26).
Em 8 de abril de 1964, o jovem Osmar tinha acabado de completar 21 anos. O que ele acreditava ser apenas mais uma quarta-feira de trabalho na agência se tornou um pesadelo: um sargento do Exército e dois sargentos da Polícia Militar entraram com metralhadoras no banco e levaram-no preso, sob a acusação de comunismo.
Ferreira começou a trabalhar no banco aos 17 anos. Durante o ensino médio, sempre foi envolvido com movimentos estudantis, chegando à liderança do Movimento Estudantil dos Secundaristas de Feira de Santana. Ele foi fundador, junto com um amigo, da Associação de Empregados dos Estabelecimentos Bancários, em 1961, que se tornaria mais tarde o Sindicato dos Bancários da cidade.
No dia 7 de abril, fez 21 anos. Nos 12 dias que se seguiram, Ferreira foi torturado e interrogado por informações que não tinha. Foi liberado condicionalmente no dia 20, com auxílio de advogados conhecidos. Foram duas semanas que ressoaram por toda a sombra da carreira que poderia ter tido, mas foi cortada precocemente. Ele foi demitido do banco e, com dificuldades de arranjar emprego na cidade, saiu de Feira de Santana e tornou-se caminhoneiro, como o pai. Depois, fez faculdade de Direito e começou a atuar como advogado.
O Banco da Bahia, antes público, foi comprado pelo Bradesco em 1999. Com o conhecimento adquirido na graduação, Ferreira fez um requerimento ao banco em 2003, que só foi julgado em dezembro de 2010. Abriu uma ação trabalhista, para que o banco pague os direitos trabalhistas desde o momento da demissão até hoje.
A juíza responsável pelo caso homologou o pedido e mandou penhorar o valor devido a ele pelo banco. Entretanto, a instituição entrou com uma medida judicial, alegando que ele não tinha direito a nenhum pagamento, apenas à readmissão.
E assim está sendo: por pedido da juíza, na quarta-feira (26) Osmar Ferreira se apresentou ao Bradesco para iniciar o processo de readmissão. Antes de voltar a trabalhar efetivamente, o idoso precisará passar pelos exames admissionais. Até agora, segundo o idoso, não há movimentação do banco para pagar os seus direitos trabalhistas. Entretanto, ainda assim, Ferreira mostra-se satisfeito só por voltar. "É aquela história: dinheiro não é tudo na vida. A honra e a dignidade são o mais importante para o ser humano, e eu me sinto honrado em ter sido readmitido", diz.
Procurado pelo CORREIO, o Banco Bradesco disse que não vai comentar o caso.
Busca por justiça
De acordo com Ferreira, a Comissão de Anistia foi essencial para a obtenção de justiça no seu processo de reclamação trabalhista. O órgão, criado em 2003 para analisar o requerimento de anistias para prisões e violências sofridas durante a ditadura militar, busca a restauração da justiça e da memória das violações cometidas nessa época.
O bancário é anistiado político desde 2010. Ele só voltou a se envolver com o sindicato após a anistia, quando se refiliou. Segundo Ferreira, ele não podia fazer isso antes da anistia por risco de ser preso novamente.
Fonte: A Voz da Região / Correio24Horas