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Governo e exportadores brasileiros aguardam com apreensão o anúncio de um novo tarifaço pelo governo Donald Trump que promete elevar impostos de importação nos Estados Unidos contra diversos países e produtos.
O anúncio está previsto para a quarta-feira (2/4), que está sendo chamada pelo republicano de "Liberation Day" (Dia da Libertação).
Na visão de Trump, encarecer as importações vai proteger e fortalecer a indústria doméstica, enquanto críticos afirmam que vai encarecer a produção americana e desatar uma guerra comercial global.
Até o momento, não está claro qual será o impacto para o Brasil, que tem os Estados Unidos como seu segundo maior parceiro comercial, atrás apenas da China.
Diferentes cenários estão no radar: desde o mais otimista, em que apenas o etanol teria aumento de tributação, até o mais pessimista, em que uma nova taxa de importação seria aplicada de forma linear a tudo que os EUA compram de exportadores brasileiros, dentro da nova "política de reciprocidade" de Trump.
Segundo essa política, a Casa Branca deve elevar suas tarifas de importação ao mesmo patamar dos tributos cobrados sobre seus produtos exportados — e o Brasil é um dos países que, segundo a avaliação da gestão republicana, tem barreiras comerciais mais duras, seja por meio de tarifas de importação mais altas ou por outras regras, como exigências sanitárias e burocráticas.
A proposta, que ainda será apreciada na Câmara dos Deputados, tinha como foco inicial reagir a barreiras ambientais europeias ao agronegócio brasileiro, mas ganhou impulso diante da nova política tarifária dos EUA, reunindo amplo apoio no Congresso e no governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Por enquanto, o principal impacto da gestão Trump para o Brasil veio da decisão de começar a aplicar, em 12 de março, uma taxa de 25% sobre todas as importações de aço e alumínio.
A medida é importante porque produtos derivados de ferro e aço são o segundo item brasileiro mais exportado para os EUA, tendo somado US$ 2,8 bilhões em vendas em 2024, ficando apenas atrás de petróleo (US$ 5,8 bilhões).
Além disso, há a previsão de que a taxa cobrada sobre o etanol brasileiro vendido aos EUA passe de 2,5% para 18% a partir de 2 de abril, para igualar a taxa cobrada do Brasil sobre o etanol comprado dos americanos — mas o produto tem menos relevância nas exportações brasileiras.
O governo do presidente Lula tenta evitar que essa taxação entre de fato em vigor, ao mesmo tempo em que negocia para que o país seja poupado de um amplo tarifaço, mas o cenário continua incerto.
Ele não descarta acionar a Organização Mundial do Comércio (OMC) ou retaliar os EUA com mais barreiras, caso as negociações não funcionem.
"Antes de fazer a briga da reciprocidade, ou de fazer a briga na Organização Mundial do Comércio, a gente quer gastar todas as palavras que estão no nosso dicionário para fazer um livre comércio com os Estados Unidos", disse Lula no sábado (29/03), durante viagem oficial ao Vietnã.
Já o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, tem dito que um tarifaço do governo Trump contra o Brasil seria "injustificável".
"Nossa conta é deficitária com os Estados Unidos. Então, nos causaria uma certa estranheza se o Brasil sofresse algum tipo de retaliação injustificada", reforçou na segunda-feira (31/03).Esse tem sido o principal argumento do governo brasileiro nas negociações com a Casa Branca: destacar que, historicamente, o Brasil importa mais do que vende para os americanos.
Nos últimos dez anos (2015 a 2024), o país acumulou déficit de US$ 43 bilhões nas trocas comerciais com os EUA, segundo as estatísticas do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços.
O rombo, porém, tem recuado. No último ano, o saldo ficou positivo para os americanos em cerca de US$ 300 milhões apenas, com o país de Trump comprando US$ 40,4 bilhões em produtos do Brasil (12% das exportações brasileiras) e vendendo US$ 40,7 bilhões para cá (15,5% das importações do Brasil).
"Caso as medidas [do tarifaço de Trump] sejam direcionadas apenas aos países com os quais os EUA têm grandes déficits comerciais ou que têm participação relevante no comércio norte-americano, o Brasil provavelmente não será impactado inicialmente", prevê relatório econômico do banco BTG Pactual, publicado em 26 de março."Contudo, se forem aplicadas tarifas generalizadas a setores específicos, como ocorreu recentemente com o aço, ou se os critérios incluírem países com barreiras comerciais superiores às americanas, o Brasil poderá ser diretamente afetado, possivelmente com impacto mais significativo neste segundo cenário", continua o relatório.
Segundo o BTG Pactual, os setores mais afetados por uma alta mais generalizada de tarifas sobre itens brasileiros seriam "produtos manufaturados e semimanufaturados que hoje entram com baixo imposto nos EUA".
"Exportações de bens de capital e automotivos (máquinas, equipamentos de transporte) poderiam sofrer leve retração na demanda nos EUA. No agronegócio, produtos como café e suco de laranja – dos quais os EUA são importantes compradores – enfrentariam encarecimento moderado no mercado americano, potencialmente levando a uma pequena perda de participação para concorrentes de outros países", analisa ainda o relatório.A consultoria de risco político internacional Eurasia Group, por sua vez, acredita que o Brasil deve entrar na lista de países que receberão uma tarifa global sobre seus produtos.
Caso isso se confirme, a expectativa é que seja aplicada uma tarifa de 10% a 25% sobre as exportações brasileiras, disse à BBC News Brasil o diretor-executivo para as Américas da Eurasia Group, Christopher Garman.
Para ele, dois fatores devem contribuir para o Brasil entrar na lista ampla de taxação: a percepção do governo Trump de que o Brasil é um país protecionista contra os EUA, e o momento ruim na relação política dos dois países.
Ele lembra que a atual gestão da Casa Branca tem proximidade com a família do ex-presidente Jair Bolsonaro, opositor de Lula, e tem criticado o Brasil por decisões do Supremo Tribunal Federal contra redes sociais como o X, de Elon Musk, que integra o governo Trump.
Fonte: A Voz da Região \ G1