Um dos mais renomados especialistas em risco político do mundo, o americano Ian Bremmer, de 53 anos, diz acreditar que o julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), marcado para quinta-feira (22/6), exacerba a "polarização política ao alimentar o sentimento da direita de que as instituições são parciais" e teme por suas "consequências extremas".
Nesse dia, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) vai analisar ação movida pelo PDT sobre ataques do ex-presidente ao processo eleitoral, em virtude de uma reunião com embaixadores realizada em junho de 2022.
Dependendo do veredito, Bolsonaro pode se tornar inelegível, ou seja, impossibilitado de concorrer a cargo público por oito anos, o que o tiraria da corrida presidencial de 2026.
Na opinião de Bremmer, "responsabilizar políticos é fundamental", mas pode "reforçar a percepção de grande parte da população de que o Judiciário pode estar sujeito à influência política" em um ambiente polarizado como a sociedade brasileira.
Ele também considera que, qualquer que seja o veredito, Bolsonaro não sairá de cena.
"Mesmo que Bolsonaro seja considerado inelegível, ele continuará influente. Qualquer candidato da oposição com sua bênção seria forte", assinala.
Especialista em países emergentes e fundador do Eurasia Group, uma das maiores consultorias de risco político do mundo, com escritórios nos Estados Unidos, Reino Unido, Japão, Cingapura e Brasil, Bremmer e sua equipe assessoram alguns dos maiores investidores do mundo com suas análises.
Também é autor do best-seller Nós versus Eles: o fracasso do globalismo.
Bremmer concedeu a seguinte entrevista à BBC News Brasil por e-mail antes do julgamento de Bolsonaro.
Ian Bremmer - O julgamento exacerba a polarização política ao alimentar o sentimento da direita de que as instituições são parciais e vão combatê-los a todo custo.
Mas não considero que tenha impacto no governo Lula e na agenda política de curto prazo. E, mesmo que Bolsonaro seja considerado inelegível, ele continuará influente. Qualquer candidato da oposição com sua bênção seria forte.
BBC News Brasil - Politicamente falando, o senhor vê o julgamento como bom ou ruim para o cenário político divisivo do Brasil? É um sinal de que as instituições democráticas estão funcionando ou um sinal de vingança política da esquerda? Ou ambos?
Bremmer - Responsabilizar os políticos é fundamental. Mas um julgamento rápido com consequências extremas em um ambiente polarizado provavelmente é ruim, pois aprofunda ainda mais essas divisões. Reforça a percepção de grande parte da população de que o Judiciário pode estar sujeito à influência política.
Não vejo isso como uma vingança da esquerda; vejo isso mais como uma reação a um movimento político baseado na retórica anti-establishment e no ataque a tribunais, mídia e outras instituições.
BBC News Brasil - O senhor acredita que o julgamento pode desencadear mais polarização na sociedade brasileira?
Bremmer - Sim. Os apoiadores da direita verão isso como um sinal reforçando sua visão de que são perseguidos injustamente.
BBC News Brasil - E poderia tornar a extrema direita mais forte, ganhar impulso? Ou mais fraca?
Bremmer - Não vai desencadear agitação nem dar impulso à extrema-direita no curto prazo, mas eles vão se manter mobilizados e podem tomar as ruas se o governo Lula sofrer uma crise política ou econômica mais grave.
BBC News Brasil - O senhor traça algum paralelo com o julgamento de Trump? Coincidentemente, os dois ex-presidentes, do mesmo espectro político, antes com laços estreitos entre si, estão sendo julgados ao mesmo tempo, mas ainda contam com grande apoio popular.
Bremmer - Os paralelos são claros, mas os casos são diferentes. Eles não terminarão necessariamente da mesma maneira. Mas uma coisa parece mais clara — que problemas judiciais não tiram os líderes políticos de cena. O presidente Lula é uma prova disso.
Fonte: A Voz da Região / Correio Braziliense