O Ministro da Educação, Camilo Santana, irá debater novas mudanças no Ensino Médio no Brasil. A decisão, que já havia sido adiantada pelo ministro, está publicada no Diário Oficial da União (DOU), desta quinta-feira (9). A portaria Nª 399, instituiu um Grupo de Trabalho com representantes de diversas organizações educacionais, além da comunidade escolar e da sociedade civil para avaliar e reestruturar a nova política nacional do Ensino Médio.
De acordo com o DOU, durante 90 dias, o grupo promoverá audiências públicas, oficinas de trabalho, seminários e pesquisas nacionais com estudantes, professores e gestores escolares sobre a experiência de implementação do Novo Ensino Médio de todo o país. A revogação, no entanto, está descartada.
A notícia foi comemorada pela estudante Rebeca Magalhães, de 16 anos. Ela é aluna do segundo ano da Rede de Ensino do Ceará e desde que as mudanças começaram, sente dificuldade de absorver o conteúdo dado em sala de aula. Com interesse em cursar a faculdade de psicologia, Rebeca se sente atrasada em relação aos outros estudantes. "Às vezes sinto que eles estão mais avançados em relação a algumas matérias, como matemática, por exemplo. Eu ainda estou fazendo a primeira atividade que o professor passou, pois foi a única, e meus colegas já estão na terceira", reclama.
Desde 2022, as disciplinas tradicionais passaram a ser agrupadas em áreas do conhecimento (linguagens, matemática, ciências da natureza e ciências humanas). Com as mudanças, Rebeca só tem uma aula de geografia por semana. "Eu tenho a sensação de estar meio perdida sobre humanas, mesmo tendo mais aulas de humanas pela área de conhecimento que escolhi. E também tenho medo de me arrepender depois porque na adolescência a gente muda de ideias rapidamente e todo o tempo que dediquei na área escolhida, será perdido", relata.
O novo modelo aprovado em 2017 está sendo implementado nas escolas públicas e particulares, de forma gradativa, desde o ano passado e recebendo diversas críticas de pais, estudantes, professores e especialistas no tema. Além da redução da carga horária das disciplinas, as principais reclamações giram em torno da falta de estrutura das escolas, da superficialidade dos conteúdos e da falta de formação dos professores para atuar no novo modelo.
Gabrielle Portela é professora de geografia da Rede Estadual e precisa se desdobrar para atender as expectativas em sala de aula. "Eu só tenho 50 minutos de sala de aula, por semana, para cada turma. É inviável questionar, estimular o pensamento crítico e explorar o conteúdo. Existem trilhas mais complexas que o professor precisa planejar para conseguir desenvolver. Muitas vezes, recebo o PDF da trilha e não recebo nenhuma orientação de como trabalhar em sala", ressalta a educadora.
As trilhas trabalham os conhecimentos de forma integrada, como o ensino da matemática aplicada às ciências humanas, por exemplo. Para Gabrielle, o formato atual do Ensino Médio não é direcionado para os alunos aprenderem conteúdo. "Os alunos já saem com deficiências do Ensino Fundamental e no Ensino Médio a gente deveria aprofundar os temas e prepará-los para o Enem. Mas eles não estão sendo preparados para competir por uma vaga com quem estuda no ensino privado. O ensino interdisciplinar acabou com a geografia física no Ensino Médio e a geografia humana é vista de forma superficial com outras ciências", considera a professora.
Mas embora o modelo tenha muitas críticas, especialistas apontam pontos positivos com as mudanças. A historiadora e professora Ticiana Antunes lembra que a nova perspectiva do Ensino Médio "com protagonismo estudantil vem sendo discutida desde a década de 80, pelo educador Paulo Freire", que defendia uma pedagogia de visão mais crítica no processo ensino-aprendizagem, mas que foi acelerado pelo golpe de 2016, contra a ex-presidenta Dilma Rousseff. "O golpe foi feito de forma a priorizar o tecnicismo e a retirar as ciências humanas dos currículos e isso com certeza é muito ruim. De maneira geral, como a mudança chegou nos professores foi problemática, mas eu acredito que a metodologia do Novo Ensino Médio é potente. O que a gente precisa é reformular algumas questões e nesse sentido, acredito que o Camilo está certo ao propor isso", considera.
O secretário de assuntos jurídicos do Sindicato Apeoc, que representa os professores do Ceará, professor Maurício Manoel, destaca "a ampliação para 3 mil horas de aulas para o Ensino Médio inteiro, o espaço para o professor criar disciplinas, a reserva de carga horária para se trabalhar outros tipos de conhecimento e inteligência" como avanços. "Um outro questionamento plausível também nesse momento é 'revogando, o que fica no lugar?' O Ensino Médio anterior, que também era péssimo e fomentou uma mudança?" Tudo isso precisa ser maturado. Fato é que mudanças são necessárias e essas mudanças precisam passar pelos professores e comunidade escolar", defende o representante do Sindicato.
Fonte: A Voz da Região / Brasil de Fato